quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Os melhores romances da FC brasileira - Parte 1

Há algumas semanas, conversando com meu colega de Anuário, Marcello Branco, discutimos a respeito dos melhores romances da ficção científica brasileira. Esta é uma daquelas discussões difíceis, porque passa por muitas definições nem sempre possíveis, especialmente em se tratando de ficção científica, além da definição de romance que, no Brasil, tem a ver com a forma narrativa e, nos EUA, com o tamanho físico do texto.
Como eu me importo muito pouco essas definições, vou fazer aqui um levantamento do que, na minha opinião, está entre o melhor que os autores brasileiros de ficção fantástica já produziram.

Por uma questão de pioneirismo, inicio a lista com O Doutor Benignus (1875), de Augusto Emilio Zaluar, embora não seja ficção científica na minha opinião – pelo menos não mais do que A volta ao mundo em 80 dias, de Julio Verne. O romance, resenhado no Anuário 2007, conta sobre uma expedição científica ao planalto central, movida por um intelectual do Rio de Janeiro em busca da prova da habitabilidade do Sol, que acaba acontecendo apenas numa visão do protagonista depois de avistar a queda de um meteoro. O mais interessante da história toda é a descrição da natureza da região central do Brasil que, se não é exata, pelo menos é inspiradora.
Ainda que muita gente torça o nariz, eu não tenho nenhum pudor em relacionar a novela "O alienista" (1882), de Machado de Assis, como uma das mais importantes obras da ficção científica brasileira. Muito antes da New Wave, Machado já especulava sobre as ciências humanas - no caso, a psicologia, que só seria tema da FC internacional mais de 50 anos depois dele. Resenhada no Anuário 2008, em homenagem ao centenário da morte do autor, a novela conta sobre a decisão de um respeitado médico psiquiatra em compreender a mente humana e extirpar dela toda e qualquer loucura. Para isso, instala uma clínica numa pequena cidade interiorana e começa a realizar seus estudos com a população local. Os considerados loucos eram imediatamente trancafiados e submetidos ao tratamento experimental do médico. Aos poucos, toda a população da cidade acaba aprisionada no manicômio.

Outro romance a ser registrado é o excelente A Amazônia misteriosa (1925), de Gastão Crulz, que li há poucas semanas e será resenhado no Anuário 2010. Em muitos apectos, parece-se com o romance de Zaluar, com amplo destaque para a descrição da natureza amazônica, especialmente sua geografia, que o autor executa com maestria. Contudo, Crulz avança vigorosamente na ficção científica ao instalar, no meio da selva, uma aldeia na qual vive um importante cientista europeu que ali desenvolve um trabalho secreto, no qual utiliza os animais e a população nativa da região. Qualquer semelhança com A ilha do Dr. Moreau, de H. G. Wells, não deve ser coincidência.

O escritor modernista Menotti Del Picchia emplaca dois títulos nesta lista. A filha do inca (1930) e Kalum (1940), ambos passados mais ou menos no mesmo universo. Também são histórias que ocorrem em meio à floresta tropical da região centro-oeste, porém Del Picchia não se dedica com tanto afinco a descrever o ambiente e investe mais e melhor nos personagens e nas situações de ação. Em A filha do inca, os sobreviventes de uma expedição científico-militar dizimada por um ataque indígena, descobrem uma cidadela perdida onde habita uma civilização de robôs, descendente de antigos navegadores fenícios que chegaram à América centenas de anos antes de Colombo.

Em Kalum, novamente às voltas com uma tribo agressiva de índios, o sobrevivente de uma equipe de filmagens acaba por encontrar uma civilização de homens minúsculos vivendo nas profundezas de uma caverna. Ambos os livros foram comentados no Anuário 2005.

Por ser o mais polêmico romance de toda a FCB, O presidente negro (1926), de Monteiro Lobato, tem que ser lembrado. É racista, mas é relevante. Conta a história de um jovem escriturário meio boçal que, depois de uma acidente automobilístico, é socorrido por uma jovem cientista que está pesquisando a história do futuro através de um equipamento chamado porviroscópio, inventado por seu pai, um cientista de renome. Nesse futuro, os EUA elegem o primeiro presidente negro, criando um grande problema político para a civilização. O livro foi resenhado no Anuário 2006.

Uma das obras primas da ficção científica brasileira é Zanzalá (1936), de Afonso Schmidt, FC de primeira linha, com tudo o que o gênero tem direito: futuro distante, tecnologia extrapolada, utopia e um movimentado conflito militar. Conta a história de um casal que se muda para um povoado utópico encravado nas encostas da Serra do Mar. Ali, vivem em perfeito idílio e comunhão total com a natureza e com seus semelhantes. Porém, a felicidade desse povo não é vista com bons olhos pelos povos bárbaros no norte que, a certa altura, atacam o povoado com toda a sua potência bélica. Sem dúvida, uma obra de fôlego que merece ser lembrada. O romance foi resenhado no Anuário 2006.

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